quinta-feira, 25 de julho de 2013

OS ESTUPROS NO EGITO

25/07/2013 06h00 - ATUALIZADA EM: 25/07/2013 10h36 - por Graziela Salomão

“OS ESTUPROS NO EGITO SÃO UMA FORMA DE IMPEDIR O DIREITO DAS MULHERES SE MANIFESTAREM”
Yasmine El Baramawy foi estuprada em novembro do ano passado enquanto protestava na praça Tahrir. Foram repetidas vezes e por dezenas de homens. Veja o depoimento que a egípcia deu a Marie Claire




Yasmine El Baramawy decidiu não se calar e contou sua história como forma de ajudar outras mulheres. "O estupro é uma vergonha para o estuprador, não para o estuprado" (Foto: Arquivo Pessoal)
As manifestações em massa no Egito trazem outra coisa além das pessoas nas ruas desde a derrubada de Mohammed Morsi. No começo de julho, uma nova onda de abusos sexuais atingiu, ao menos, 91 mulheres, de acordo com a organização Human Rights Watch. E uma delas teve coragem de revelar o que sofreu.
A musicista Yasmine El Baramawy, de 30 anos, decidiu se manifestar desde o início dos protestos que invadiram o Egito. Em 23 de novembro do ano passado ela estava na icônica praça Tahrir quando foi atacada por, pelo menos, 15 homens. Passada a raiva e o medo de andar nas ruas de seu país, ela decidiu contar o que aconteceu com ela. “O estupro é uma vergonha para o estuprador, não para o estuprado”. Leia o depoimento de Yasmine para Marie Claire.
“Participei dos protestos desde janeiro de 2011 pedindo por justiça social e liberdade. O protesto no qual fui atacada era contra a declaração constitucional fascista de Morsi, publicada no dia 21 de novembro. Claro que às vezes sentia medo do perigo, principalmente quando as forças de segurança ou os bandidos nos atacavam. Mas nunca imaginei que pudesse ser estuprada ali.
O ataque aconteceu de repente no meio do gás lacrimogênio. Um homem me agarrou dizendo que estava me protegendo. Fiquei em choque, mas não com medo. Também senti muita raiva, mas nunca tive medo. O ataque começou com 15 homens. Em seguida, dezenas deles me estupraram com as mãos ou com objetos pontiagudos, mas não com o pênis. Depois, rasgaram minha roupa. Um deles veio com um canivete por trás e me estuprou.
Não conseguia nem piscar porque estava completamente em choque. Por várias vezes tentei me livrar deles e lutava de volta contra as agressões. Não sabia como aquilo terminaria, mas decidi lutar até que alguma coisa, qualquer coisa, acontecesse. Ou eu morreria ou alguém conseguiria me salvar.
Fui levada para uma região distante e eles continuaram me estuprando. Nesse bairro, uma mulher e seus vizinhos perceberam o que estava acontecendo e me ajudaram. Ela me puxou para cima de um carro e os parentes e vizinhos dela lutaram contra os agressores.
A musicista de 30 anos vai continuar participando dos protestos em Cairo (Foto: Arquivo Pessoal)
MARCAS NA ALMA
Por algum momento, desejei sair do Egito e nunca mais voltar. Esse sentimento permaneceu por alguns dias, mas depois desapareceu. Agora posso dizer quero ficar aqui. Depois de tudo o que aconteceu sei que fiquei mais forte e mais confiante. Claro quepenso nisso a maior parte do meu dia, mesmo tentando não pensar, até porque isso se transformou em algo público e tirou essa chance de mim. Mas, contar essa história para outras mulheres me permite ir esquecendo o que aconteceu aos poucos. Tive medo de andar pelas ruas do meu país por um período. Só que andei até que esse medo fosse embora. Depois do que aconteceu, a forma que encontrei de me proteger é andar em pequenos grupos. Assim, posso continuar participando dos protestos. E, sim,vou continuar até o fim.

DIREITO DAS MULHERES
Os estupros no Egito durante as manifestações são uma forma clara de impedir o direito de as mulheres se manifestarem. Este crime acontece apenas na praça Tahrir e contra manifestantes anti-Morsi. É uma forma de assustar as mulheres e suas famílias para que não se juntem aos protestos. Isso arruína a imagem dos revolucionários.

Sei que me transformei em um exemplo quando decidi revelar minha identidade e o que aconteceu. Divulgar a minha mensagem sobre o estupro não é um erro. A vítima não pode sentir vergonha disso. A vergonha deve vir de quem o praticou. Acho que a verdade ajuda a entender o tamanho real do problema como uma forma de encontrar uma solução adequada para isso. Se não soubermos do problema, nunca estaremos aptos para resolvê-lo.
Se eu encontrasse os homens que fizeram isso comigo, não seria violenta como eles foram. Simplesmente conversaria com eles. Tenho muitas questões sobre as mulheres na vida deles e sobre o jeito de eles pensarem. Tenho muitas perguntas que precisam ser respondidas e a principal delas é “Por que vocês ficaram rindo de mim?”.
Se eu pudesse dizer algo para mulheres que passaram o mesmo que eu, diria que não se machuquem pelo que aconteceu simplesmente porque algumas pessoas doentes tentaram prejudicá-las. Elas são as vítimas, não você. Gostaria de dizer tanto para os homens, quanto para as mulheres, que o estupro é uma vergonha para o estuprador, não para o estuprado. Nunca fiquei com vergonha. Acredito que esse é o meu destino e eu o aceitarei.”

TRÁFICO HUMANO


ESCRAVIZADAS NA ITÁLIA: PAÍS É UM DOS PRINCIPAIS DESTINOS DE VÍTIMAS DO TRÁFICO HUMANO


Uma de cada dez brasileiras vítimas do crime identificadas no país trabalhava em ambiente doméstico e em condições análogas à escravidão


ITÁLIA É UM DOS PRINCIPAIS DESTINOS DAS MULHERES TRAFICADAS DO BRASIL (Foto: Reprodução)

No final de fevereiro, uma missão do governo federal, composta por representantes de quatro ministérios, esteve em Roma e Milão para ajustar com as autoridades locais detalhes de um plano de cooperação para o enfrentamento ao tráfico humano. A Itália é um dos principais destinos de vítimas desse tipo de crime. “Nos últimos 2 anos, 128 brasileiros e brasileiras foram identificados em operações da polícia italiana”, afirmou Paulo Abrão, secretário Nacional de Justiça, à Marie Claire Online. “Uma de cada 10 vítimas vivia em ambiente doméstico e em condições análogas à escravidão. Também foram descobertos casos de casamento servil e de exploração sexual de travestis”.

Entre as traficadas, há mulheres que foram levadas para trabalhar como domésticas e acabaram em reclusão absoluta. Sem contato com o mundo exterior. Abrão ressalta que combater essa modalidade do crime é mais complicado porque as vítimas permanecem longos períodos em ambientes privados e, em geral, desconhecem seus direitos trabalhistas. O secretário explica que, além das vítimas escravizadas pelos patrões, há um outro importante contingente de mulheres exploradas pelos companheiros naquele país. Algumas trabalhavam no mercado do sexo no Brasil e foram atraídas com a promessa de casamento. Na Itália, foram obrigadas pelos companheiros a continuar se prostituindo para bancar as despesas da casa.


Fugir desse tipo de situação não é tão simples e se torna ainda mais difícil quando há filhos envolvidos na relação. Uma das maneiras de os exploradores obrigarem as mulheres a ficarem na Itália é impedindo que a dupla nacionalidade das crianças seja registrada. “As mulheres que conseguem se desvencilhar dos companheiros, muitas vezes, têm de permanecer no país porque não podem vir para o Brasil com os filhos”, diz Abrão. “Essas vítimas são seduzidas com promessas amorosas e de casamento. Mas quando chegam lá descobrem que a pessoa que imaginavam ser um companheiro de vida não é o que elas imaginavam”.