PASTORA QUE PREGAVA CURA GAY REVELA: "FIZ TUDO O QUE A IGREJA MANDOU
FAZER PARA DEIXAR DE SER LÉSBICA, NÃO DEU CERTO"
Ali no número 1600 da Avenida São João, no centro de São
Paulo, existe uma igreja evangélica em que as pessoas celebram a palavra de
Deus, pagam dízimos, cantam em uníssono músicas animadas sobre o evangelho, e,
em plena quarta-feira, lotam as cadeiras para acompanhar o culto. Tudo isso
seria exatamente igual a qualquer outra igreja, se não fosse o fato de que a Comunidade Cidade
de Refúgio se
tratasse de uma igreja inclusiva, que recebe de portas abertas gays e lésbicas,
sem julgamentos sobre suas orientações sexuais.
Para falar sobre a igreja, é preciso adentrar a história de duas mulheres que
tiveram suas vidas completamente modificadas em 2002, quando se apaixonaram: Lanna Holder e Rosania Rocha.
EX-LÉSBICA E EX-HÉTERO.
Lanna sempre soube sua orientação
sexual e aos 17 anos teve sua primeira experiência com uma mulher. No entanto,
acreditava que sendo lésbica seria condenada ao inferno. Aos 21 anos se
converteu à religião evangélica e deixou de lado uma companheira. Pouco depois
se casou com um pastor, teve um filho, e a religião passou a ser parte
principal de sua vida. Pelas igrejas do Brasil, ela pregava sobre a “cura” a
que havia sido submetida e passou a ser vista como um exemplo a ser seguido - e
uma prova viva de que seria possível superar a homossexualidade.
Em vídeos disponíveis no YouTube, é possível ver
longos sermões da pastora pregando sobre a maldição e o pecado da
homossexualidade. Igrejas lotadas de fiéis aclamaram suas palavras e
acreditaram estar diante de uma pessoa “regenerada” e “trazida de volta ao
caminho do bem”.
Em 2002, no entanto, a história mudou quando Lanna
conheceu Rosania em uma igreja evangélica em Boston, nos Estados Unidos.
Rosania, que morava na cidade, onde era dirigente de louvor de uma igreja
frequentada por brasileiros, era casada com um pastor, com quem teve um filho.
Muito conhecida na comunidade evangélica por cantar músicas gospel, iniciou uma
grande amizade com Lanna, de quem sempre estava perto nos cultos: onde Lanna
pregava, Rosania cantava. Da amizade ao amor bastaram seis meses e suas vidas
foram viradas de cabeça para baixo. De celebridades evangélicas adoradas, Lanna
e Rosania viraram párias na religião que ajudavam a espalhar.
Confira abaixo a entrevista que o Vírgula Lifestyle fez por
telefone com as pastoras:
Como foi a sua conversão e o processo para se tornar uma
ex-lésbica?
Lanna - Eu tinha 21 anos quando me converti à religião
por achar que iria para o inferno por causa de minha orientação sexual. Eu
usava drogas, era alcoólatra e quando me converti essa parte da minha vida
deixou de existir. A religião funcionou como um processo de restauração na
minha vida, mas a minha orientação sexual nunca foi alterada. Eu nunca
vivenciei nenhum processo de cura, mesmo assim segui numa busca constante para
deixar de ser lésbica. Eu pensava: ‘Deus me libertou das drogas e do alcoolismo
e não consegue me libertar da homossexualidade?’. Na igreja, a homo afetividade
é apresentada ou como uma possessão demoníaca ou como uma doença. Eu tentava
lidar com as duas coisas. ‘Se é uma doença, Deus vai ter que curar e se eu
estiver possessa de algum espírito maligno, Deus vai ter que me libertar’.
Tentei por sete anos.
A religião faz uma lavagem cerebral contra a
homossexualidade?
Lanna - Hoje eu cheguei à
conclusão de que a religião demoniza tudo o que ela não explica e não entende.
A homossexualidade é uma questão muito cheia de ramificações e interpretações.
A própria igreja não chega a um consenso sobre o que pensa a respeito. Enquanto
tem uma parte que garante que é uma possessão demoníaca, outra parte tem
certeza de que é uma doença. Por
mais que no fundo a igreja saiba que a homossexualidade não é abominável, ela
se recusa a corrigir um erro. É difícil
voltar atrás e reconhecer que errou depois de milênios condenando os
homossexuais. É mais fácil manter como está.
Você escondia sua verdadeira orientação sexual ou estava convicta
de que havia sido realmente “curada”?
Lanna - Eu divulgava essa tal cura havia sete anos e pregava contra a
homossexualidade. As pessoas me conheciam como “A missionária Lanna Holder,
ex-lésbica”. Quando fui pra Boston, eu já estava conformada, achando que teria
que viver minha vida toda escondendo minha verdadeira orientação sexual. Eu
mentia, pois tinha certeza de que a minha orientação sexual era imutável, ao
contrário do que eu fazia as pessoas acreditarem. Fiz tudo o que a igreja
mandou fazer para deixar de ser lésbica: quebra de maldição, cura interior,
desligamento de alma, quebra de vínculo. Depois de tudo, minha orientação
sexual não mudou e então cheguei à conclusão de que fazia parte da minha
natureza. Esconder foi a minha única opção. Fiquei casada com um homem, não
porque era o que eu queria, mas porque era o imposto para que eu não fosse para
o inferno.
Como foi o momento em que você se viu diante da paixão por
uma mulher após tantos anos garantindo ser ex-lésbica?
Lanna - Nos conhecemos e no
começo nos tornamos grandes amigas. Tivemos uma associação total na religião e
quando chamavam a Rosania para cantar, me chamavam para pregar. A vida nos
uniu. Viajamos pelos Estados Unidos juntas e eu confidenciava a ela os
problemas que tinha em meu casamento, pois como o “exemplo” que eu era, não
podia contar para ninguém o que eu enfrentava. Não falava sobre minha
orientação sexual, mas conversávamos sobre diversas questões. Quando me dei
conta, tudo o que eu fazia era pensando na Rosania. Eu queria estar ao lado
dela e percebi que aquilo que eu sentia não era apenas amizade. Eu chorei
muito, orei muito e perguntava a Deus quando aquilo passaria. Minha paixão por
ela começou a confrontar com tudo aquilo que eu dizia ser errado em minhas
pregações.
Como você encarou a paixão pela Lanna já que nunca havia tido
interesse em uma mulher antes?
Rosania – Eu percebi um
sentimento diferente por ela e então conversamos e admitimos estar apaixonadas.
Choramos muito, pedimos muito perdão a Deus e, como éramos casadas, nos
sentíamos muito erradas, pois cometemos adultério. Nosso pecado na verdade não
foi o nosso amor, mas sim o fato de sermos casadas e de adulterarmos por seis
meses. Quando eu era criança, me sentia um pouco diferente das minhas amigas.
Mas nunca tinha tido contato sexual com uma mulher até, de repente, me ver
apaixonada pela Lanna. Nada foi planejado, deixei o barco me levar, tentei
fugir, ficamos separadas, mas a vida nos uniu. Eu sempre digo que me apaixonei
por um ser humano e não necessariamente por uma mulher.
Como foi a reação da igreja ao saber que vocês estavam juntas?
Rosania - Contamos aos nossos
maridos e depois aos nossos líderes, que nos aconselharam a não contar nada a
ninguém para preservar a imagem da igreja. Confiamos que tudo daria certo, eu
pensei que voltaria para meu marido e que a Lanna seguiria a vida dela, já que
estava decidida a se separar. Mas assim que viramos as costas, eles (os
líderes) pegaram o telefone e começaram a ligar para toda a comunidade
evangélica contando a novidade. Eu morei 20 anos nos Estados Unidos e convivi
com pessoas na igreja a quem considerava parte de minha família. Quando tudo
aconteceu, tudo mudou. Eu entrava no banheiro para passar um batom, e as mesmas
pessoas que se diziam minhas amigas, saíam imediatamente. Se tivéssemos nos
apaixonado por outros homens e cometido adultério do mesmo jeito, a reação
teria sido completamente diferente. Passaríamos por um período de disciplina e
nossos “amigos” continuariam por perto. Como me apaixonei por uma mulher, subi
ao púlpito e pedi perdão por ser quem eu era, mas nunca mais consegui me
encaixar na igreja. Me usavam para pregar sobre pecado e aquilo acabou se
tornando um circo.
Muitos nos disseram que não tínhamos caráter por
termos assumido nosso amor, mas para ter coragem de enfrentar tudo e todos, foi
preciso muito caráter. Eu poderia ter ficado cantando e a Lanna pregando sem
nunca ninguém imaginar que tínhamos algo. Muitas pessoas da igreja são
hipócritas, pregam uma coisa e fazem outra. Tem gente casada que prega para
multidões e sai para pegar as menininhas da cidade, tira a roupa na frente da câmera
e coisas do gênero. São pessoas assim que nos massacram. Eu me sinto muito mais
em paz com Deus sendo o que sou de verdade.
Lanna – Quando eu me converti, já comecei a pregar que
eu era uma ex-lésbica e então me tornei uma referência da cura. Na minha época
eu era um Silas Malafaia falando que homossexualidade era coisa do demônio, que
os gays iam para o inferno. É interessante perceber como a gente cai do cavalo
com as nossas convicções. Eu que tanto perseguia os gays, me tornei uma
perseguida com o mesmo discurso que eu usava ao assumir minha homossexualidade.
Como é a relação com seus ex-maridos atualmente?
Rosania – Temos uma relação muito
bacana. Ele se casou de novo e será pai mais uma vez. Ele mora nos Estados
Unidos e sempre o vejo, pois meu filho mora com ele.
Lanna – Só falo com meu ex-marido sobre assuntos
relacionados ao nosso filho.
Como é a relação com seus filhos (Rosania tem um filho de 15 anos
e Lanna tem um filho de 11 anos)
Rosania – De toda essa história,
a coisa mais legal é a nossa relação com nossos filhos. Somos uma família
incrível, agimos de maneira muito natural. Meu filho ama a Lanna e adora
conversar com ela. Aliás, ele conta mais coisas pra ela do que pra mim. Não tem
como uma pessoa afirmar que uma família constituída por gays não é coisa de
Deus. Somos uma família feliz que vive em harmonia.
Como surgiu a ideia da igreja inclusiva?
Lanna – Tentamos frequentar
outras igrejas, mas sempre ouvíamos as mesmas afrontas dos pastores no púlpito
contra os gays. Começamos a fazer amizade com uma série de ex-evangélicos que
também não eram aceitos na igreja por conta de sua orientação sexual. Pensamos
em fazer algo em nossa casa mesmo, mas em 2011 inauguramos a igreja com 15
pessoas, hoje temos cerca de 500 membros.
Tirando o fato da igreja inclusiva aceitar os homossexuais, o que
mais a diferencia das outras?
Lanna – Nada, se alguém entrar
aqui sem saber que é uma igreja inclusiva vai achar que é uma igreja evangélica
como qualquer outra. Sexo é só depois do casamento, temos dízimos e ofertas,
louvamos a palavra de Deus... A bíblia do gay é a mesma do hétero, a única
diferença é que interpretamos diferente a questão da homossexualidade. Não
somos ativistas gays, mas acreditamos na inclusão.
Como vocês conquistam novos fieis?
Lanna - O evangelismo mais
difícil é o de um gay. Primeiro que você já tem que entregar o folheto da
igreja dizendo que ele é aceito como é, caso contrário eles rasgam o papel na
nossa cara, jogam no chão... Na abordagem, eles logo acham que somos da igreja
do pastor que fala mal, então já nos apresentamos como pastoras casadas antes
de fazer o convite. Vamos nos pontos de maior concentração do público gay em
São Paulo, que é a região da avenida Paulista, a rua Vieira de Carvalho e
outras. Paramos nas portas das boates e fazemos flashmobs, cantando e dançando.
Com isso, geramos curiosidade e eles se aproximam para saber de onde somos.
Sempre vêm várias pessoas à igreja depois dessas abordagens. Vamos também à
Parada Gay, à Feira da Diversidade e à Caminhada Lésbica entregar nossos
folhetos.
O que os evangélicos convencionais acham da Comunidade Cidade de
Refúgio?
Lanna - Tem pessoas que vêm
aqui na porta para nos afrontar, teve uma senhora que quase me agrediu aqui na
frente. Nos xingam, dizem que a nossa igreja é Sodoma e Gomorra, que é coisa do
diabo. Há quem ligue e fale desaforos, deixe recadinhos mal-educados nas redes
sociais... Tem quem pense, obviamente não é todo mundo, que aqui tem
imoralidade, promiscuidade, que é um ponto de encontro para achar parceiros
sexuais.
O que vocês acham do Silas Malafaia?
Lanna - Não temos nada contra o Silas Malafaia, mas achamos que ele só
cresceu na religião baseado em polêmicas, a bola da vez são os homossexuais.
Ele tem um discurso prepotente de dono da verdade e usa de muita ira para se
referir aos gays. Lamentamos muito isso, porque o Silas Malafaia afasta todos
os gays da igreja, pois eles acabam achando que todos os pastores pensam dessa
forma. Mas ele não representa a maioria dos pastores. Ele não sabe o que ele
fala (se referindo à comparação feita por Malafaia de gays a bandidos). Pregue
a palavra de Deus, Malafaia! Pare de fazer polêmica!
E Marco Feliciano?
Rosania - A única coisa que temos
a dizer ao Feliciano é: “cresça”! Ele é uma pessoa narcisista e tudo o que ele
faz é para ganhar holofotes. Infelizmente ele está conseguindo isso da pior
maneira possível.
Fonte: http://virgula.uol.com.br
Boa noite pastora Maria Valda, gosto da forma como postas seus textos, com clareza e sem preconceito, isso sim é ser uma pessoa consciente, as diferenças existem, o amor é um só, tenho um casamento feliz com meu marido e isso me dá a alegria de poder entender as pessoas, pois quando somos felizes somos bons e não julgamos comportamentos de ninguém.
ResponderExcluirAinda bem que elas estão sabendo enfrentar as adversidades, que sejam felizes,no amor e na fé, é o meu desejo!
Homo-afetividade nunca foi condenada por Jesus!
Grande abraço.
Deixo claro, de início, que eu sou heterossexual, adoro mulher, respeito-as com as rainhas da vida, os enfeites da natureza. Mas, cá "pra nós, para quê envolver-se com igrejas? Por quê deixar que a tradição dos avós e pais tornem a mente tão empoeirada, que não se enxergue 1 palmo adiante do nariz? Duas coisas os líderes religiosos querem: holofotes e dinheiro. Uma vez entendido isso, cai-se fora e dá-se uma banana para os espertalhões!
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